Um estudo inédito realizado pelo Medscape, plataforma de divulgação de informações e ferramentas de ponto de atendimento para profissionais de saúde, revelou dados sobre frequência de assédio, abuso e má conduta sexual na área da saúde do Brasil. Segundo o levantamento, médicos foram apontados como os responsáveis pelo assédio em 46% das experiências de assédio relatadas pelos participantes do estudo.
A pesquisa foi realizada com um total de 885 médicos, residentes, enfermeiros e estudantes de medicina assinantes do Medscape em português, entre 11 de junho a 7 de setembro de 2024. Do total de respondentes, 57% eram homens e 43% eram mulheres.
O levantamento identificou que o assédio ocorre com mais frequência em situações de hierarquia, com 46% das vítimas sendo assediadas por superiores, 37% por colegas de mesmo nível hierárquico e 17% por subordinados.
“Eu estava no estágio de Pediatria, no setor de urgência, quando ocorreu o assédio. O preceptor médico me chamou para acompanhá-lo na evolução dos pacientes na enfermaria. No meio do caminho, começou a me fazer perguntas pessoais: se eu morava sozinho, em qual local, e se eu namorava. Ele chegou, inclusive, a insinuar que eu devia aprontar bastante por morar sozinho na cidade. Fiquei constrangido e tentei mudar de assunto”, comenta um dos participantes do estudo.
O estudo também mostrou que o assédio também ocorre por parte dos pacientes. Cerca de 15% dos profissionais afirmaram ter enfrentado situações de sexualização explícita por parte dos pacientes, incluindo convites para sair, comentários inapropriados e gestos inadequados. 8% deles receberam abordagens diretas que ultrapassaram os limites profissionais.
O levantamento também indicou que muitos profissionais realizaram mudanças na rotina de trabalho para evitar contato com os agressores.
Segundo a pesquisa, 37% dos entrevistados mudaram suas rotinas por medo ou desconforto e evitou trabalhar com determinados colegas quando possível. 22% respondeu que passou a ter dificuldade de concentração e 14% pensou em pedir demissão. Por outro lado, 34% afirmaram que o assédio não influenciou diretamente no seu comportamento.
A pesquisa também mostrou que, além da mudança de rotina, a maioria das vítimas não denunciou o agressor por meio ou receio de retaliação no ambiente de trabalho.
“78% das pessoas que responderam nosso questionário on-line não denunciaram o perpetrador, sendo que 54% justificaram essa decisão afirmando acreditarem que nenhuma providência seria tomada”, comenta Leoleli Schwartz, editora sênior do Medscape em português.
Apesar dos dados do estudo, cerca de 46% dos entrevistados acreditam que o assédio sexual passou a ser tratado com mais seriedade no ambiente de trabalho. Além disso, 70% apontaram que a cobertura midiática sobre o assunto e sobre condutas inadequadas em outros setores — como esporte, cinema e política — contribuiu para ampliar a conscientização e promover discussões abertas na área médica.
Procurado pela CNN para comentar os dados do estudo, o Conselho Federal de Medicina (CFM) não se manifestou até o momento da publicação desta matéria.
Segundo o Medscape, os comportamentos que constituíram assédio, abuso ou má conduta sexual incluem:
Entre os comportamentos vivenciados pessoalmente no local de trabalho, a invasão deliberada do espaço pessoal/aproximação excessiva foi descrita por 51% dos respondentes. Já 47% afirmam terem recebido toques, abraços, carinhos ou contato físico indesejado, e 44% vivenciaram comentários sexuais sobre partes do corpo/características físicas; olhares maliciosos ou sexualizados para partes do corpo.
Segundo o levantamento, o centro cirúrgico foi considerado o local onde a maior parte dos assédios aconteceu, com 22% das respostas, empatado com a unidade de atendimento ao paciente. Em seguida, aparece a sala dos médicos (20%), corredor (20%) e área administrativa não acessível aos pacientes (19%).
Mais de 50% dos brasileiros vão ao médico apenas com problemas graves
[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/