Um estudo inédito, realizado no Hospital Sírio-Libanês, mostrou que 71,8% dos pacientes idosos receberam um alerta para o uso de medicamentos potencialmente inapropriados enquanto estavam internados. Também conhecidos pela sigla PIMs, esses medicamentos podem trazer algum risco para os pacientes, como maior permanência no hospital e maior risco de eventos adversos.
“O uso desses medicamentos, por exemplo, pode agravar o quadro clínico e aumentar os custos para o sistema de saúde”, afirma Pedro Curiati, médico geriatra do Núcleo de Medicina Avançada do Hospital Sírio-Libanês e responsável pelo estudo.
Para o trabalho, foram analisadas 15 mil internações de pessoas com 60 anos ou mais, utilizando um sistema de suporte à decisão clínica integrado ao prontuário eletrônico dos pacientes. Esse sistema utiliza inteligência artificial (IA) para gerar alerta sobre a segurança e o uso correto de medicamentos durante a internação do paciente.
Ao longo da pesquisa, foram avaliados os alertas relacionados aos PIMs para idosos e sua associação com os riscos de agravamento do quadro de saúde dos pacientes internados. O foco do estudo foi entender se os alertas gerados identificavam pacientes com maior risco e como isso estava relacionado às suas evoluções clínicas.
Os resultados apontaram que 71,8% deles apresentaram pelo menos um alerta de uso de PIMs. “Pacientes cujas prescrições acionaram esses alertas tendem a ter internações mais prolongadas, incluindo complicações, além de mais eventos adversos, como quedas, confusão mental e até morte”, explica Curiati.
Segundo o especialista, a taxa alta de alerta pode estar relacionada ao fato de pacientes idosos terem a concomitância de doenças de maior gravidade, mas também pode estar associada a uma estadia no hospital mais prolongada e mais complicada.
Segundo Curiati, medicamentos potencialmente inapropriados para idosos são aqueles cuja relação entre benefício e potencial de risco são menos favoráveis para essa faixa etária. Em outras palavras, são remédios cujos efeitos colaterais podem ser mais graves e recorrentes do que os benefícios que podem oferecer a pessoas acima dos 65 anos.
“O idoso é mais suscetível a eventos adversos e efeitos nocivos de medicamentos por vários motivos que são inerentes ao envelhecimento“, afirma o geriatra. “Existem vários critérios para definir quais são esses medicamentos, mas o sistema que utilizamos no hospital se baseia em um banco de informações bastante abrangente e que sinaliza o médico de forma automática e gera conscientização sobre medicamentos que devem ser evitados para alguns pacientes”, completa.
De acordo com o especialista, diversos medicamentos para diferentes tipos de tratamento têm o potencial de gerar algum risco ao paciente. Geralmente, esse risco está associado a alguma predisposição ou comorbidade pré-existente no paciente, mas também pode surgir devido ao risco de interação medicamentosa — quando dois medicamentos são usados juntos e podem ter seus efeitos alterados no organismo.
“Segundo nosso estudo, um dos medicamentos potencialmente inapropriados mais comuns é o omeprazol e outros remédios da mesma família. Esse tipo de remédio atua diminuindo a acidez do estômago e ele é muito importante e necessário para pessoas com alto risco de sangramento estomacal, por exemplo”, afirma Curiati. “Apesar de ter indicações muito bem definidas nessas situações, é muito comum as pessoas usarem esse remédio sem indicação ou por um período prolongado. Esse uso reduz a acidez do estômago, muda o pH da região, o que pode afetar a absorção de nutrientes, como a vitamina B12, cuja falta está associada à demência”, exemplifica.
Outro risco associado ao uso inapropriado do omeprazol em pacientes internados é o favorecimento de complicações como broncoaspiração, podendo favorecer o risco de pneumonia. “A pessoa por ter uma acidez menor no estômago pode favorecer a proliferação de algumas bactérias na parte alta do aparelho digestivo. Ao, eventualmente, ter um refluxo, a comida pode voltar para o canal errado e atingir o pulmão, aumentando o risco de pneumonia hospitalar”, explica o geriatra.
O especialista também cita medicamentos hipnóticos, como as chamadas “drogas Z” (zolpidem, zaleplona e zopiclone, por exemplo) e os benzodiazepínicos (temazepam, rivotril, entre outros), entre os potencialmente inapropriados. “Eu costumo dizer que eles são ‘extintores de incêndio’. Então, eles são ótimos quando você precisa lidar com uma crise, já que agem rápido, mas o uso prolongado está associado à dependência. Tem bastante evidência crescente de que aumenta o risco de demências, como a doença de Alzheimer. Também aumenta o risco de quedas. Mas tudo isso vai depender da forma como o medicamento está sendo usado e se o uso é prolongado ou persistente”, afirma.
Na opinião de Curiati, o estudo evidencia a necessidade dos sistemas de saúde se adaptarem e modernizarem seus processos de atendimento aos idosos. Segundo o especialista, o cuidado com pessoas acima de 65 anos possui particularidades que não se aplicam a pacientes mais jovens e os médicos devem estar cientes e capacitados para isso.
40% das internações por desidratação em SP são de idosos
[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/