O Supremo Tribunal Federal (STF) tem cinco votos a favor de reconhecer que é possível se recusar a passar por um procedimento médico específico por razões religiosas.
Os ministros também votaram para que as pessoas que façam essa escolha tenham garantido o direito a tratamentos alternativos que já estejam disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), inclusive fora da sua cidade de residência, se necessário.
O julgamento começou nesta quinta-feira (19) e foi suspenso por causa do horário da sessão. O tema deverá a ser analisado na próxima quarta (25).
A Corte analisa duas ações que tratam de situações envolvendo testemunhas de Jeová. Um dos preceitos para os fiéis dessa religião é a recusa em receber transfusão de sangue de outras pessoas.
A religião das testemunhas de Jeová é uma denominação cristã que afirma ter cerca de 8,8 milhões de adeptos no mundo, com pregação em 239 países.
Como os fiéis se recusam a receber transfusão de sangue, seguindo os preceitos da religião, há o ajuizamento de processos buscando reconhecer o direito ao respeito e proteção à liberdade religiosa.
Os processos são relatados pelos ministros Luís Roberto Barroso e Gilmar Mendes.
Os magistrados apresentaram propostas de teses específicas para cada caso, mas que vão no mesmo sentido de garantir o direito de recusa ao tratamento.
Até o momento, seguem as posições de Barroso e Gilmar:
Ainda faltam os votos de Nunes Marques, Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli.
Os casos em análise têm repercussão geral reconhecida — ou seja, a definição que vier a ser tomada pelo Supremo deverá ser seguida em todas as instâncias da Justiça.
Conforme os votos já apresentados, a recusa a determinado tratamento médico que viole a religião requer algumas condições.
Cabe só ao paciente ter essa escolha. Ou seja, ela não pode ser feita por outra pessoa. Isso vale também para filhos menores de idade de pais que sigam a religião.
Nesses casos, pela proposta apresentada até o momento, os pais só poderão optar pelo tratamento alternativo para os filhos se ele for eficaz, conforme avaliação médica.
Os ministros ainda precisam discutir pontos como os custos com locomoção, estadia e alimentação de pacientes que tenham que ir para outras cidades ou até outros estados para buscar o tratamento alternativo na rede pública de saúde.
Segundo Barroso, que relata um dos casos, o direito à recusa de transfusão de sangue por convicção religiosa tem fundamento nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e a da liberdade de religião. “A dignidade humana exige respeito a autonomia individual”, afirmou.
O ministro também disse que a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda a adoção de procedimento alternativo à transfusão de sangue.
“Em atenção a essa diretriz, outros procedimentos terapêuticos já são oferecidos pelo SUS, apesar disso, ainda não são oferecidos de forma ampla no território nacional. O poder público deve tomar medida para tornar progressivamente esse tratamento disponível”, declarou.
Os dois casos em análise pelo STF têm origem em disputas judiciais de testemunhas de Jeová.
Após terem o custeio de tratamentos alternativos rejeitado, elas buscaram na Justiça formas de realizar cirurgias sem a transfusão de sangue, alegando o direito de proteção à liberdade religiosa.
O processo relatado por Gilmar Mendes é o de uma paciente que foi encaminhada para a Santa Casa de Maceió para a realização de uma cirurgia de substituição de válvula aórtica (localizada no coração).
A mulher se negou a assinar um termo de consentimento que previa a possibilidade de realização de eventuais transfusões de sangue durante o procedimento.
Ela acionou a Justiça dizendo estar ciente dos riscos da cirurgia sem transfusão de sangue, e que optou por rejeitar esse procedimento em respeito a sua religião.
Nas instâncias inferiores, a Justiça rejeitou o pedido da paciente. O argumento principal é que, embora haja declarações de médicos apontando ser possível realizar o procedimento sem a transfusão, não há garantias de que tal método seria isento de riscos para a paciente.
Já o outro processo, que está com Barroso, é um recurso da União contra decisão que a condenou, junto com o estado do Amazonas e o município de Manaus, a arcar com uma cirurgia sem transfusão de sangue em outro estado.
A condenação envolveu a ordem para pagar toda a cobertura médico-assistencial de um procedimento de artroplastia total (substituição de articulação por prótese).
O Amazonas não ofertava esse tipo de cirurgia sem transfusão de sangue.
[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/