Câncer de mama: cientistas alertam para falta de dados e acesso ao tratamento

Saúde

Um grupo multidisciplinar de especialistas se juntou para combater o câncer de mama e as atuais desigualdades em relação ao acesso ao diagnóstico e tratamento. Em relatório publicado na segunda-feira (15), a Lancet Comission afirma que, apesar de as taxas de tratamento e sobrevivência ao câncer de mama terem melhorado em países desenvolvidos, ainda persistem desigualdades e muitos pacientes não recebem tratamento adequado.De acordo com o relatório, no final de 2020, cerca de 7,8 milhões de mulheres que haviam sido diagnosticadas com câncer de mama nos cinco anos anteriores ainda estavam vivas. Isso reflete o progresso na investigação e na gestão do câncer, o que reduziu em 40% a mortalidade pela doença na maioria dos países desenvolvidos. Leia Mais No entanto, cerca de 685 mil mulheres morreram devido ao câncer de mama em 2020. Isso, junto com as desigualdades e o sofrimento relacionados aos sintomas físicos, emocionais e aos custos financeiros relacionados ao tumor, que, muitas vezes, são ocultados e abordados de forma inadequada, são desafios urgentes que devem ser enfrentados.Diante disso, a Lancet Comission para o câncer de mama estabeleceu recomendações para reduzir essas lacunas e aumentar o conhecimento em torno da doença.“Melhorias recentes na mama a sobrevivência ao câncer representa um grande sucesso da medicina moderna. No entanto, não podemos ignorar quantos pacientes são sistematicamente abandonados. A nossa Comissão baseia-se em evidências anteriores, apresenta novos dados e integra as vozes dos pacientes para esclarecer um grande fardo invisível”, afirma Charlotte Coles, autora principal da Comissão e professora do departamento de oncologia da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, em comunicado à imprensa.“Esperamos que, ao realçar estas desigualdades, os custos e o sofrimento ocultos no cancro da mama, eles possam ser melhor reconhecidos e abordados pelos profissionais de saúde e pelos decisores políticos, em parceria com os pacientes e o público em todo o mundo”, completa.Um dos exemplos de desigualdade citados no relatório refere-se aos dados sobre pacientes com câncer de mama metastático. Segundo a Comissão, o número de pessoas que vivem com o estágio avançado do tumor ainda é desconhecido, pois os casos estão subnotificados. Esse cenário dificulta a promoção de ações que atendam as necessidades desses pacientes, levando a sentimentos de abandono e isolamento.“O câncer de mama metastático continua a ser pouco compreendido pelo público, pelos decisores políticos e até pelos profissionais de saúde”, afirma Lesley Stephen, colaboradora do relatório. “Alguns pacientes me disseram que se sentem ‘descartados’. Essa sensação de serem ignorados e deixados para trás pode significar que é menos provável que procurem ajuda ou se envolvam em pesquisas que possam ajudá-los. Um diagnóstico de câncer de mama metastático não deve impedir a contribuição de uma pessoa para a sociedade, mas os pacientes com doença metastática precisam de mais apoio e informação para se sentirem valorizados.”Apesar disso, a Comissão avalia que, na última década, os dados relacionados ao câncer de mama metastático melhoraram consideravelmente. De acordo com o relatório, a sobrevida global média para dois subtipos de câncer de mama metastático (HER2 positivo e ER positivo/HER2 negativo), que representam 85% dos pacientes com esse tipo de tumor, atingiu cinco anos quando as terapias recomendadas são disponibilizadas para esses pacientes.Os autores do relatório defendem que haja um maior registro sobre a recidiva de câncer de mama e sobre tumores em estágio metastático. Para eles, esses dados podem melhorar significativamente os cuidados dos pacientes com a doença, refletindo em uma maior taxa de sucesso no tratamento e no bem-estar emocional entre os pacientes.Iniciativas que promovam a inclusão social de pessoas que vivem com câncer de mama metastático também são fundamentais, na visão da Comissão. Como exemplo, os autores citam alterações nas leis trabalhistas para possibilitar acordos de trabalho mais flexíveis. “Com uma mudança de percepção, poderá ser possível tratar a maioria dos pacientes, aliviar o sofrimento e não esquecer quem vive com a doença”, argumenta a Comissão.Outros dois pontos importantes citados pelo relatório da Comissão estão a captação de custos relacionados ao câncer de mama, incluindo custos físicos, psicológicos, sociais e financeiros, e a necessidade de uma melhor comunicação entre médico e paciente.Em estudo piloto, a Comissão fornece uma visão geral de custos econômicos e das necessidades de cuidados para pessoas com câncer de mama. Quase todas as 606 pessoas que vivem com câncer de mama e cuidadores ouvidos pela Comissão declararam problemas físicos ou de bem-estar relacionados à doença, como a perda de emprego e as dificuldades relacionadas à vida sexual.Além disso, 20% dos participantes com câncer de mama em estágio inicial e 25% daqueles com tumor metastático relataram dificuldade em cobrir os custos de viagem para tratamento. Já 27% com câncer de mama inicial e 35% com metastático disseram ter problemas financeiros. Esses resultados sugerem que, mesmo em países com um sistema de saúde gratuito (como o SUS – Sistema Único de Saúde), pacientes com câncer de mama podem ter custos “ocultos”.O relatório também aponta a necessidade da comunicação entre paciente e profissional de saúde. Uma análise feita pela Comissão sugere que essa é uma intervenção importante que pode melhorar a qualidade de vida, a tomada de decisões, a imagem corporal e, até mesmo, a maior adesão à terapia, tendo impactos positivos na sobrevivência desses pacientes.“Todo profissional de saúde deveria receber algum tipo de treinamento em habilidades de comunicação. Melhorar a qualidade da comunicação entre pacientes e profissionais de saúde, embora aparentemente simples, poderá ter impactos positivos profundos que vão muito além do contexto específico da gestão do cancro da mama. Os pacientes devem ser encorajados a exercer a sua voz, escolhendo o seu nível de envolvimento nas decisões de cuidados”, afirma Reshma Jagsi, professora da Escola de Medicina da Universidade Emory, nos Estados Unidos.

[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/