Conheça o paradoxo do enforcamento inesperado e por que ele intriga cientistas

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Em um tempo no qual dezenas de inteligências artificiais nos dão sempre respostas certas para as questões apresentadas, um exercício de lógica, que não tem uma resposta única e é universalmente aceita, tem viralizado nas redes sociais: o chamado paradoxo do enforcamento inesperado.

Divulgado como um paradoxo pelo influente filósofo inglês Michael Scriven na revista de filosofia Mind em 1951, o desafio foi proposto pela primeira vez pelo matemático sueco Lennart Ekbom na década de 1940.

Projetado para explorar os limites do raciocínio lógico e da nossa compreensão de conhecimento e previsibilidade, o paradoxo continua até hoje como um desafio à pesquisa e ao debate.

O conceito desafia cientistas a rever suas compreensões de lógica, conhecimento e causalidade.

A história do paradoxo começa em um sábado. Um juiz conhecido por cumprir sua palavra e suas sentenças à risca condena um prisioneiro a ser enforcado na semana seguinte.

“O enforcamento ocorrerá ao meio-dia, em um dos próximos sete dias, mas você não saberá a data até ser informado na manhã do dia da execução”, diz a sentença.

O paradoxo surge quando o prisioneiro raciocina junto com seu advogado:

Tranquilo com a lógica do advogado, o preso diz para si mesmo: “Isso só sai amanhã. Mas eles não podem me enforcar amanhã porque eu sei hoje!” — e dormiu tranquilo, porque teve certeza de que a decisão do juiz não poderia ser concretizada na prática.

Até que…

Na manhã da quarta-feira, o preso foi surpreendido com o anúncio, feito pelo próprio carrasco, de que iria executá-lo ao meio-dia.

Como, logicamente, ele não esperava por isso, até ser informado naquele exato momento, a sentença do juiz foi executada, e o prisioneiro também, da forma como foi proferida.

Seguindo todas as argumentações perfeitamente lógicas do advogado, o prisioneiro foi acordado do seu sonho de impunidade com a visita desconcertante do carrasco. O que pode ter dado errado?

Fã do paradoxo, o filósofo inglês Michael Scriven achava que o conceito era (e é) tão fascinante por sua sutileza na distinção entre conhecimento e crença, e como isso afeta nossas expectativas e a própria definição de surpresa.

“O lógico repassa pateticamente os movimentos que sempre fizeram o feitiço funcionar, mas, por algum motivo, o monstro, a realidade, não entende a ideia e segue em frente”, dizia.

O fato é que, apesar de muitas discussões, ainda não se chegou a uma resolução satisfatória do paradoxo, e ele continua intrigando os cientistas.

Acostumados a estudar os princípios do raciocínio válido e a estrutura dos argumentos, os lógicos tentam sempre expor falhas no paradoxo, enquanto os epistemólogos de plantão vão mais fundo e questionam a validade do conhecimento.

A princípio, poderíamos pensar que o único dia no qual o prisioneiro não se surpreenderia fosse apenas o sábado, pois ele saberia de antemão, na sexta-feira, que isso ocorreria.

Ainda assim, na quinta à noite ele teria dois dias possíveis, mas não o conhecimento, que só viria a adquirir depois de sobreviver à sexta-feira.

Há quem defenda que a forma como a sentença foi proferida foi apenas uma armadilha do juiz, para que o prisioneiro chegasse àquela conclusão lógica, e a surpresa fosse maior.

Mas até isso não funcionaria se considerado que o condenado fosse um pessimista contumaz.

Nesse caso, ele rejeitaria os argumentos do advogado e acordaria todos os dias com a certeza de que seria enforcado. Impossível de ser surpreendido, será que ele escaparia da forca?

Talvez o que nos intrigue a todos, leigos e cientistas, seja a forma com a qual o paradoxo zomba da nossa compreensão de conhecimento e previsão, principalmente quando a tecnologia nos dá todas as respostas.

E é um exemplo de que um evento futuro pode ser conhecido como verdadeiro por uma pessoa (poderosa?), mas não por outra, até que aconteça.

Nesse sentido, o paradoxo do enforcamento inesperado se assemelha ao experimento mental do físico austríaco Erwin Schrödinger que, ao introduzir o seu gato vivo-morto numa caixa fechada com um frasco de veneno, quebrou a lógica clássica.

Como esse paradoxo lógico é de 1935, talvez Ekbom já soubesse que, afinal de contas, existe um terceiro estado para uma proposição.

Assim, da mesma forma que o gato, o prisioneiro esteve vivo e morto em sua cela, até receber a terrível notícia do carrasco.

Mas, no caso do condenado, a coisa foi ainda pior, pois ele usou a lógica binária para descartar todos os dias possíveis, e, exatamente por fazer isso, ficou vulnerável à surpresa e teve que incluí-los de forma angustiante para depois descartá-los em um looping que durou até o meio-dia de quarta-feira.

[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/