Efeito placebo: como nosso cérebro pode ser enganado por remédio falso?

Saúde

Quando sentimos dor, é comum procurarmos alívio de alguma forma. Como resultado dessa expectativa, o cérebro pode buscar maneiras de aliviar essa dor e, de fato, levar a uma melhora do sintoma, mesmo quando não há uso de medicamentos eficazes para isso. Esse fenômeno é tecnicamente conhecido como “efeito placebo” e sua existência tem sido documentada há décadas.

Em ensaios clínicos, que avaliam a eficácia de um medicamento para tratar uma determinada doença, o efeito placebo é comumente visto nos grupos de controle (que não recebem a substância em teste). Essas pessoas recebem uma pílula falsa e espera-se que ninguém do grupo veja benefício ao receber esse tipo de tratamento. Afinal, ele não contém a molécula com potencial efeito benéfico para um determinado sintoma ou condição de saúde. Ainda assim, alguns participantes relatam benefício.

A forma como o efeito placebo acontece era, até então, desconhecida. Porém, um novo estudo publicado na prestigiosa revista científica Nature descobriu uma peça-chave do quebra-cabeça de como o efeito placebo acontece, principalmente na redução da dor.

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Pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade da Carolina do Norte, Estados Unidos, com colegas de Stanford, do Instituto Médico Howard Hughes e do Instituto Allen de Ciência do Cérebro, descobriram uma via de controle da dor que liga o córtex cingulado na parte da frente do cérebro, através da região da ponte do tronco cerebral, ao cerebelo na parte de trás do cérebro.

O estudo foi realizado em camundongos e, nele, os cientistas mostraram que certos neurônios e sinapses (comunicação entre os neurônios) que acontecem ao longo dessa via são altamente ativados quando os ratos têm uma expectativa do alívio da dor. Em seguida, os animais, de fato, sentem o alívio do sintoma, mesmo quando não recebem medicamentos.

“Que neurônios em nosso córtex cerebral se comuniquem com a ponte e o cerebelo para ajustar os limiares de dor com base em nossas expectativas é completamente inesperado, dado nosso entendimento prévio do circuito da dor, e incrivelmente emocionante”, afirma Greg Scherrer, professor associado do Departamento de Biologia Celular e Fisiologia da UNC, em comunicado à imprensa.

“Nossos resultados abrem a possibilidade de ativar essa via por outros meios terapêuticos, como medicamentos ou métodos de neuroestimulação para tratar a dor”, completa.

Para realizar o estudo, os pesquisadores geraram a expectativa de alívio da dor em camundongos. Enquanto os ratos estavam experimentando o efeito placebo, os cientistas usaram experimentos que os ajudaram a ver e estudar a complexa neurobiologia do efeito placebo até os circuitos cerebrais, neurônios e sinapses por todo o cérebro.

Os cientistas descobriram que, quando os ratos tinham a expectativa de alívio da dor, os neurônios do córtex cingulado anterior projetavam seus sinais para o núcleo pontino, uma via que não tinha função estabelecida na dor ou no alívio do sintoma. Segundo os pesquisadores, a expectativa de melhora do sintoma aumentou os sinais ao longo dessa via.

“Há uma abundância extraordinária de receptores opioides aqui, apoiando um papel na modulação da dor”, diz Scherrer. “Quando inibimos a atividade nesta via, percebemos que estávamos interrompendo a analgesia placebo e diminuindo os limiares de dor. E então, na ausência do condicionamento placebo, quando ativamos esta via, causamos alívio da dor”, completa.

Por fim, os cientistas descobriram que um conjunto de grandes células chamado células de Purkinje, que são semelhantes aos ramos do cerebelo, mostraram padrões de atividades parecidas aos dos neurônios do córtex cingulado anterior durante a expectativa do alívio da dor. Para os pesquisadores, essa é uma evidência do papel do cerebelo na redução da dor.

Devido ao efeito placebo, ensaios clínicos de medicamentos e substâncias terapêuticas são considerados desafiadores e exigem o maior número de voluntários possível para que os cientistas comparem o benefício real do medicamento contra a pílula falsa.

Nesse sentido, o novo estudo oferece uma maneira de entender o que acontece no cérebro de uma pessoa que experiencia o efeito placebo para tentar reverter o “efeito placebo” em ensaios clínicos futuros.

“Todos nós sabemos que precisamos de melhores maneiras de tratar a dor crônica, particularmente tratamentos sem efeitos colaterais prejudiciais e propriedades viciantes”, comenta Scherrer. “Acreditamos que nossas descobertas abrem a porta para atingir essa nova via neural da dor para tratar as pessoas de uma maneira diferente, mas potencialmente mais eficaz”, completa.

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[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/