Cientistas da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, desenvolveram uma ferramenta de inteligência artificial (IA) capaz de prever se pessoas com sintomas precoces de demência irão desenvolver ou não Alzheimer. Segundo os pesquisadores, a tecnologia poderá reduzir a necessidade de testes de diagnósticos caros e invasivos, além de permitir que o tratamento da doença seja realizado de forma precoce. Os resultados obtidos com a tecnologia foram publicados na revista eClinical Medicine na sexta-feira (12).
A demência é uma condição caracterizada pelo declínio geral de habilidades mentais, como memória, linguagem e raciocínio lógico. O Alzheimer é a causa mais comum de demência, correspondendo de 60% a 80% dos casos. O diagnóstico precoce da doença é fundamental para a eficácia do tratamento.
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No entanto, detectar a condição em estágio inicial e prever seu prognóstico requer o uso de testes invasivos ou caros, como a emissão por pósitrons (PET) ou punção lombar. Consequentemente, até um terço dos pacientes pode ser diagnosticado de forma incorreta ou tardia, dificultando o sucesso do tratamento.
Diante disso, uma equipe liderada por cientistas do Departamento de Psicologia da Universidade de Cambridge desenvolveu um modelo de aprendizado de máquina (um tipo de IA) capaz de prever se e quão rápido uma pessoa com sintomas leves de declínio cognitivo progredirá e desenvolverá o Alzheimer.
Os pesquisadores usaram dados de mais de 400 pacientes coletados rotineiramente, a partir de exames de ressonância magnética e testes cognitivos. Eles participavam de uma coorte de pesquisa nos Estados Unidos.
A partir disso, os cientistas testaram e validaram o modelo de IA criado por eles usando dados de mundo real (como prontuários médicos e dados de dispositivos de saúde, por exemplo) de pacientes de mais 600 pacientes e dados longitudinais (acompanhados ao longo do tempo) de 900 pessoas de clínicas de memória no Reino Unido e em Cingapura.
Segundo a pesquisa, a IA foi capaz de distinguir entre pessoas com comprometimento cognitivo leve e estável e aquelas que progrediram para a doença de Alzheimer em um período de três anos. Além disso, o algoritmo identificou corretamente indivíduos que desenvolveram a doença em 82% dos casos, e identificou corretamente aqueles que não a desenvolveram em 81% dos casos. Tudo isso foi possível utilizando apenas dados de testes cognitivos e ressonância magnética.
Ainda conforme o estudo, a IA foi cerca de três vezes mais precisa em prever a progressão do Alzheimer em comparação ao padrão atual de tratamento (marcadores clínicos padrões, como atrofia da substância cinzenta ou pontuações cognitivas, ou diagnóstico clínico). Para os pesquisadores, isso mostra que o modelo pode reduzir significativamente o diagnóstico incorreto da doença.
O modelo de IA também permitiu que classificar os pacientes de acordo com o quão rápido o Alzheimer pode avançar no futuro, com base em dados da primeira visita de cada pessoa à clínica de memória. Os pacientes foram divididos em três grupos:
Segundo os pesquisadores, as previsões foram validadas ao analisar dados de acompanhamento ao longo de seis anos. Isso é importante por poder ajudar a identificar pessoas em estágio inicial que podem se beneficiar de novos tratamentos, ao mesmo tempo que identifica quem precisa de monitoramento mais próximo já que a condição pode evoluir rapidamente.
“Criamos uma ferramenta que, apesar de usar apenas dados de testes cognitivos e exames de ressonância magnética, é muito mais sensível do que as abordagens atuais para prever se alguém progredirá de sintomas leves para Alzheimer — e, em caso afirmativo, se esse progresso será rápido ou lento”, afirma Zoe Kourtzi, professora do Departamento de Psicologia da Universidade de Cambridge, em comunicado à imprensa.
“Isso tem o potencial de melhorar significativamente o bem-estar do paciente, mostrando-nos quais pessoas precisam de cuidados mais próximos, ao mesmo tempo, em que remove a ansiedade para aqueles pacientes que prevemos que permanecerão estáveis. Em um momento de intensa pressão sobre os recursos de saúde, isso também ajudará a remover a necessidade de testes diagnósticos invasivos e dispendiosos desnecessários”, completa.
Como o algoritmo foi validado em mais de 900 pacientes de clínicas de memória no Reino Unido e em Cingapura, o método pode ser aplicável em ambientes clínicos e com pacientes do mundo real, segundo pesquisadores.
“Problemas de memória são comuns à medida que envelhecemos. Na clínica, vejo como a incerteza sobre se esses podem ser os primeiros sinais de demência pode causar muita preocupação para as pessoas e suas famílias, além de ser frustrante para os médicos que prefeririam dar respostas definitivas. O fato de que podemos reduzir essa incerteza com informações que já temos é emocionante e provavelmente se tornará ainda mais importante à medida que novos tratamentos surgirem”, afirma Ben Underwood, psiquiatra consultor honorário da Cambridgeshire and Peterborough NHS Foundation Trusts (CPFT) e professor assistente do Departamento de Psiquiatria da Universidade de Cambridge.
A equipe agora quer estender seu modelo para outras formas de demência, como demência vascular e demência frontotemporal, e usar diferentes tipos de dados de saúde, como marcadores de exames de sangue.
Alzheimer: o que a ciência já desvendou sobre a doença
[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/