Liberdade de expressão na Era Digital

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A liberdade de expressão é um dos pilares fundamentais de qualquer sociedade democrática, permitindo que indivíduos possam expressar suas opiniões sem medo de sofrer represálias. A liberdade de expressão permite que ideias sejam ventiladas, debatidas e confrontadas, o que é essencial para a descoberta da verdade e para o progresso social.

O pensamento ocidental sempre teve a liberdade de expressão como uma preocupação central. A famosa citação “Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-lo” frequentemente atribuída a Voltaire, encapsula o espírito do Iluminismo, um movimento intelectual nascido na Europa que enfatizou a razão, a ciência e o respeito pelas opiniões alheias como contraponto a governos autocráticos e aos dogmas religiosos. A tradição iluminista desempenhou um papel fundamental na defesa do direito dos cidadãos de expressar suas opiniões e a tolerância em relação a diferentes pontos de vista.

Embora a liberdade de expressão seja um direito fundamental a ser protegido, ele, como qualquer outro direito, jamais foi tratado por tais pensadores como absoluto. Liberdade de expressão nunca foi vista como uma chancela para o cometimento de crimes como os de calúnia, difamação e grave ameaça. Ao redor do mundo, os sistemas jurídicos preveem mecanismos de responsabilidade pessoal no exercício da liberdade de expressão, tanto de reparação ao lesado como de penalização do agressor. Em muitas jurisdições, as leis sobre liberdade de expressão também incluem restrições para discursos que incitam à violência, ódio ou discriminação, em nome da segurança pública e da pacificação social. Mesmo árduos defensores da liberdade de expressão, como o filósofo britânico John Stuart Mill, admitem que ela pode ser restringida quando representa um risco iminente de causar dano a outras pessoas. O chamado “princípio do dano”, defendido por Mill, é uma referência importante nas discussões sobre a liberdade de expressão e suas limitações.

A verdade é que não há fórmula mágica nem maneira única de equilibrar liberdade de expressão e proteção social. Cada país responde a esse desafio de forma distinta. Nos Estados Unidos, por exemplo, a Primeira Emenda da Constituição oferece uma das proteções mais robustas à liberdade de expressão no mundo. E o debate contínuo sobre o que constitui um limite aceitável para a liberdade de expressão é parte importante da jurisprudência e da cultura americana. Outros sistemas legais adotam mecanismos mais restritos, em nome da segurança coletiva. A Alemanha, por exemplo, tem leis bem mais rigorosas que proíbem, por exemplo, a incitação ao ódio contra grupos específicos e a negação do Holocausto, em resposta às atrocidades históricas experimentadas pelo povo judeu e outras minorias no país.

O debate público sobre liberdade de expressão vem ganhando, ultimamente, ainda mais complexidade. As discussões sobre os contornos da liberdade de expressão hoje se inserem não numa defesa da livre circulação de ideias em praça pública, salões e cafés, ou em jornais e livros. Nas últimas décadas, o surgimento das redes sociais e das plataformas digitais transformou profundamente a maneira como a informação é consumida e disseminada. Na era digital, discursos e opiniões são compartilhados imediatamente de forma irrestrita, permitindo rápida e ampla disseminação de desinformação e de discursos violentos.

O debate sobre os contornos da liberdade de expressão, nesse contexto, se tornou infinitamente mais desafiador e perpassa a discussão sobre o poder e a reponsabilidade tanto do Estado quanto das plataformas digitais na moderação de conteúdos que propagam inverdades e incitam a radicalização e a violência. O tema é complexo e demanda a cooperação, e não uma oposição, entre os órgãos estatais e as plataformas.

É inegável que as redes sociais têm implementado várias iniciativas para moderar conteúdos, buscando equilibrar a liberdade de expressão com a responsabilidade de manter um ambiente seguro para os usuários. Além de estabelecer políticas e diretrizes cada vez mais claras de proibição à incitação à violência, ao discurso de ódio, ao assédio e a conteúdos que promovam comportamentos autolesivos, as redes têm utilizado algoritmos e inteligência artificial cada vez mais sofisticados para detectar e remover automaticamente conteúdos que violam tais políticas, além de moderadores humanos. Sistemas de denúncias e programas de educação e conscientização também são parte das medidas adotadas pelas plataformas, junto com a publicação de relatórios que têm dado transparência a esses esforços.

Claro que críticas podem e devem ser feitas, inclusive no exercício da liberdade de expressão daqueles que defendem medidas mais duras das plataformas para lidar com os desafios do ambiente digital. Mas é preciso não se ater à superficialidade do debate polarizado e tratar o tema com a profundidade serena que ele merece. Plataformas digitais, organizações sem fins lucrativos e órgãos estatais devem colaborar e fazer parcerias para entender melhor as dinâmicas sociais em jogo e a criar respostas eficazes a comportamentos nocivos.

O X de Elon Musk deu recentemente, no Brasil, um passo importante na busca pelo diálogo salutar com o Poder Público. Em atendimento às decisões do Ministro Alexandre de Moraes, do STF, o X indicou representante legal no país e satisfez as penalidades pecuniárias que lhe haviam sido impostas, permitindo que centenas de milhões de brasileiros voltassem a ter acesso à plataforma onde acontecem algumas das conversas mais significativas do mundo atual. A volta do X claramente contribui com o debate público sobre o tema tão complexo e multifacetado, por meio do acesso ao discurso aberto e da diversidade de opiniões ventiladas na plataforma.

É interesse comum do Estado e das redes sociais proteger os usuários contra a desinformação e abusos que podem ocorrer nesse ambiente tão dinâmico, sem se tornar condescendente com a censura ou com o cerceamento à livre circulação de ideias. Empresas e autoridades públicas atuando em conjunto e no espírito de parceria construtiva é a resposta mais eficaz para enfrentar esse desafio.

[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/