Esquecer o que comeu no dia anterior. Chegar em um cômodo da casa e não se lembrar do que iria fazer ali. Não se recordar de relatos recém-contados por amigos ou familiares. Esses são alguns exemplos comuns dos lapsos de memória que, frequentemente, são associados ao envelhecimento. No entanto, pessoas jovens podem sofrer com esquecimentos e dificuldade para lembrar tarefas simples do dia a dia.
“O déficit de memória em jovens tem crescido e isso é observado em atendimentos de consultório e em internação hospitalar”, afirma Edson Issamu, neurologista da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, à CNN.
Diferentemente das pessoas mais velhas, cujo esquecimento pode estar relacionado ao declínio cognitivo natural do envelhecimento e a condições como Alzheimer, os lapsos de memória em pessoas jovens estão relacionados, principalmente, ao estilo de vida atual e a fatores de saúde mental.
“Os jovens têm permanecido muito tempo conectados e em contato com dispositivos eletrônicos, como celulares, computadores e tablets. Isso tem impactos importantes na atividade cerebral e na saúde geral do indivíduo”, afirma Issamu.
“A hiperconectividade, geralmente, leva à falta de disciplina no horário de sono, fazendo com que o ciclo sono-vigília fique prejudicado”, acrescenta. O sono de má qualidade pode afetar a capacidade de memória e concentração, já que ele é fundamental para a consolidação e organização das lembranças e do aprendizado, de acordo com o neurologista.
Além disso, a hiperconectividade está relacionada a transtornos como depressão e ansiedade, que também podem levar ao déficit de memória. “Quando a depressão e ansiedade necessitam de tratamento medicamentoso, leva a outra causa que é a utilização de medicações de uso contínuo que interferem no funcionamento bioquímico do cérebro e que também interferem nos circuitos de memória”, explica Issamu.
Além disso, após a pandemia de Covid-19, também têm aumentado os relatos de transtornos cognitivos, incluindo os lapsos de memória. “Entende-se que isto ocorreu devido à preferência do vírus da Covid por tecidos nervosos – entrada pelos nervos olfativos e provável inflamação encefálica em locais variados que podem interferir nos circuitos de memória”, afirma.
Outros fatores de risco associados à dificuldade de memória em pessoas jovens incluem questões emocionais e de estilo de vida. O estresse é um deles, de acordo com o neurologista.
“Com a constante complexidade do mundo moderno e constante aumento de demanda em trabalho e estudos, o estresse também causa perturbações no funcionamento dos circuitos de memória, interferindo principalmente no funcionamento do hipocampo, que é uma das áreas que decidem o que vai ser armazenado na memória de médio e longo prazo”, afirma Issamu.
Hábitos pouco saudáveis, como alimentação rica em ultraprocessados e açúcar, e deficiência de vitamina B12 também estão relacionados ao déficit de memória.
“Outro fator apontado é a crescente utilização de drogas, que sabidamente destroem os circuitos neuronais relacionados com a memória. O crescente grande número de jovens usuários faz aumentar a observação sobre déficit de memória em jovens”, acrescenta.
Geralmente, os lapsos de memória podem ser tratados com mudanças nos hábitos e estilo de vida. Regular o sono e reduzir o tempo conectado a dispositivos eletrônicos pode ser útil para melhorar a função cognitiva. O mesmo vale para adoção de práticas como meditação e atividade física em geral.
No entanto, quando o déficit de memória passa a impactar negativamente as atividades diárias, trazendo prejuízos para o trabalho, estudos e vida social, é fundamental consultar um médico neurologista para investigar as causas e iniciar o tratamento adequado.
Por exemplo, a queda de hormônios causada pela menopausa pode levar aos lapsos de memória e à dificuldade de concentração. Essa condição é chamada de “névoa mental”.
Condições como Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), autismo e hipotireoidismo também estão relacionados ao déficit de memória em jovens. Nesse caso, os tratamentos adequados para cada caso são fundamentais para aliviar o sintoma.
Em casos mais sérios e raros, os problemas de memória podem ser um sinal de Alzheimer precoce, que pode surgir já aos 50 anos. Segundo Paulo Bertolucci, professor da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp), os principais fatores de risco para o desenvolvimento do Alzheimer precoce estão doenças cardiovasculares, como hipertensão, diabetes, sedentarismo, obesidade e má qualidade do sono.
“Uma pessoa que tem distúrbio como apneia ou insônia, pode ter uma menor qualidade do sono, dificultando a chegada à fase profunda do sono, aumentando o acúmulo de proteínas no cérebro que estão relacionadas ao Alzheimer”, explica, em matéria publicada anteriormente na CNN.
No entanto, Issamu ressalta que essa é uma condição rara e de difícil diagnóstico confirmatório, “não sendo a primeira opção no déficit de memória em jovens”, afirma.
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[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/