A cantora Iza, 33, comoveu o Brasil ao revelar a separação do jogador Yuri Lima, 29, com quem espera sua primeira filha. O término aconteceu na última quarta-feira (10), após a artista acusar o atleta de traição e receber prints de uma conversa dele com a criadora de conteúdo adulto Kevelin Gomes.
A separação causou tanto alvoroço nas redes sociais que gerou um debate sobre monogamia e não-monogamia, com gente afirmando que relação aberta é a solução para evitar traição. Outros, no entanto, discordaram da ideia: “Como se não existisse quebra de confiança em qualquer tipo de relacionamento”, disse um internauta.
Mas, afinal, um relacionamento aberto é uma “solução” para evitar que traições ocorram? Ou é possível ser traído mesmo quando o parceiro tem a “permissão de ficar com outras pessoas”? O que, no fim das contas, é um relacionamento aberto?
Pensando nisso, a CNN conversou com especialistas e adeptos da modalidade de relação para entender como funciona e as regras.
Leia mais
O relacionamento é um método de relacionamento em que duas pessoas estão comprometidas uma com a outra romanticamente, mas que é permitido sair, beijar ou se relacionar sexualmente com outras pessoas – desde que essas coisas façam parte do acordo entre os dois.
O que uma pessoa pode ou não fazer num relacionamento aberto depende das regras que as duas pessoas que estão se relacionando criam para o relacionamento.
Enquanto a monogamia é quando um casal só se relaciona afetiva e sexualmente entre si, o relacionamento aberto consiste em uma flexibilização afetiva e/ou sexual do casal, de acordo com regras estabelecidas pelas duas partes. A psicóloga Larissa Fonseca, doutoranda em sexualidade feminina, afirma que para a relação não-monogâmica funcionar é fundamental acordos claros e comunicação constante. “A base é o consentimento, cumplicidade e o respeito mútuo, garantindo que todos os envolvidos se sintam seguros e valorizados”, diz.
Segundo a psicanalista Mariana Ribeiro, mestranda na investigação psicanalítica de ciúmes e exclusividade amorosa, existem muitas possibilidades em uma relação aberta, com combinados mais ou menos restritivos. Há casais que só ficam com terceiros em festas, sendo que outros até podem ter relações sexuais – mas fora de casa.
“Tem muitos casais que querem manter a exclusividade afetiva, então podem ficar com outras pessoas, podem transar, mas não podem se apaixonar. Mas também tem casais abertos que são mais livres, que permitem até se apaixonar e que não têm nenhuma regra em relação a uma exclusividade”, explica.
Ela ainda destaca que “cada casal que decide abrir o relacionamento ou começar uma relação aberta vai ter que ir pensando junto cada um desses detalhes, o que eles querem e quais que eles querem que sejam os limites”.
De acordo com a psicóloga Larissa Fonseca, há traição em qualquer tipo de relação, seja monogâmica ou não. “Depende dos acordos e expectativas individuais. Se um parceiro quebra esses acordos, a confiança é comprometida, configurando a traição”, afirma.
Ou seja: estar num relacionamento aberto não te impede de ser traído, mesmo que seu parceiro tenha sua permissão para beijar outras pessoas, por exemplo.
Foi o caso da analista de produto Marisa Bilard, 29, que viveu uma traição em um relacionamento aberto. Ela combinou com o namorado que ele poderia sair com outras pessoas, mas não com amigos próximos — e nem dormir com pessoas em casa. O rapaz, no entanto, não seguiu essas regras.
Marisa descobriu por uma conhecida dos dois que ele dormia com uma pessoa em casa, quando ela estava fora viajando. “Ela me disse: ‘Só estou te avisando porque estou com dó de você, enquanto você estava viajando, ele dormia com outra menina na casa dele’. Meu mundo caiu, não achava que ia ser corna em um relacionamento aberto”, disse à CNN.
Além disso, meses depois, a analista sonhou que ele ficou com uma amiga enquanto estavam juntos e, ao contar o sonho para a jovem, confirmou mais uma traição da parte dele.
Relacionamento aberto com quem não é maduro não é a solução dos problemas
A jornalista Raquel*, que aceitou dar seu depoimento sob condição de anonimato, viveu uma situação similar quando se relacionou com uma mulher pela primeira vez. Um dos únicos combinados que elas tinham era o de sempre se conversarem e avisarem, logo no começo, caso se envolvessem romanticamente com alguém.
Raquel conta que a parceira sumiu durante um final de semana e reapareceu no domingo à noite. Para justificar a ausência, ela disse estar emocionalmente abalada, mas não explicou o porquê. Na segunda-feira, Raquel pediu para conversarem novamente — e a namorada contou que conheceu alguém. A jornalista, então, entendeu que foi “uma pessoa aleatória”, diz ela. As duas terminaram em seguida, mas em bons termos.
“Meses depois, descobri, pelo Instagram, que, na verdade, não foi uma pessoa aleatória que ela conheceu no bar. Era uma pessoa com quem ela estava trocando ideia e elas combinaram de se encontrar em um bar para ter um date”, completa.
A psicanalista Mariana Ribeiro cita Brigitte Vasallo, autora de livros como “Pensamento Monogâmico, Terror Poliamoroso” (em tradução literal do espanhol), para defender que a estrutura da monogamia se baseia em uma hierarquia: a relação do casal seria mais valiosa do que outras, como a da amizade. Também seria uma forma de garantir a transmissão da herança e dos bens acumulados para, por exemplo, os filhos. Por isso, a exclusividade afetiva e sexual.
Mesmo assim, Mariana afirma que a não-monogamia não é uma solução para a traição, mas defende que a quebra da confiança tem relação com a lógica da monogamia. Isso porque, para a psicóloga, a traição masculina em um relacionamento heterossexual, historicamente, sempre ocorreu e “foi legalizada”.
Mulheres que traem, ainda hoje em dia, são muitas vezes assassinadas ou têm seu valor questionado, diz ela. Um julgamento pelo qual homens, quando agem da mesma forma, não passam.
A não-monogamia só seria uma solução caso os envolvidos não quisessem reprimir seus desejos afetivos ou sexuais. “Mas eu acho que seria ingenuidade supor que essa seja a única razão pela qual as pessoas traem”, continua.
A mentira tem um papel fundamental na construção da individualidade da criança, para que ela possa reconhecer aquilo que é próprio dela, aquilo que é diferente do que a família sempre propôs
Segundo Ribeiro, para muitos, a traição pode ter um efeito semelhante a essa fase infantil. “O importante [para traidores] não é poder ficar com outras. O importante é poder romper algo que foi combinado. O importante é justamente poder trair. Para quem tem o prazer simplesmente no desobedecer a lei, enquanto houver qualquer lei que seja, haverá traição”, finaliza.
A psicóloga e autora de empoderamento feminino Najma Alencar diz ser muito complexo lidar com a traição, que desperta sentimentos como decepção, tristeza e raiva. “É muito sério quando acontece uma traição já que, emocionalmente falando, é um trauma. […] O que pode ajudar nesse processo de recuperação é que não tem como fugir das emoções. Evitar as emoções pode prolongar ainda mais o sofrimento”, afirma à CNN.
A profissional também destaca que a traição diz respeito a quem trai e o autocuidado nesta fase. “A traição é uma escolha do outro, não é um reflexo seu e nem sobre você. Inclusive, também é importante estar com a família e os amigos”, continua.
“Não estamos falando de uma situação, mas de um trauma, e se ele não for cuidado da melhor forma possível, pode atrapalhar sua vida e os próximos relacionamentos”, completa.
Com isso, entende-se que estamos todos sujeitos à traição — seja ela em uma relação monogâmica ou não. Afinal, há quem tenha o desejo de trair pela diversão de viver algo proibido ou até quem não está bem resolvido com seus próprios desejos, e acaba ficando com outras pessoas. O importante, quando isso acontecer, é cuidar e entender que a traição diz respeito ao traidor, e não à pessoa traída.
Masp estreia três novas exposições sobre a diversidade LGBT+
[*] – Fonte: https://www.cnnbrasil.com.br/